segunda-feira, 10 de setembro de 2012

FRAGMENTOS PARA DISCUSSÃO




1. É possível definir o que é literatura e qual é sua função?


2. E para que poetas em tempos de fome?


3. É possível definir exatamente a função da crítica e da interpretação de textos literários?


4. A crítica literária pode ou deve aspirar à totalidade? A totalidade é um horizonte possível no âmbito da crítica literária? E no âmbito da linguagem, do pensamento e do processo de obtenção do conhecimento?


5. A paralaxe é um fenômeno óptico relativamente simples que pode ser usado como método. Ela é a mudança de posição aparente de um objeto em relação a um segundo plano mais distante, quando esse objeto é visto a partir de ângulos diferentes.


6. O Objeto só pode ser percebido quando de lado, sob uma forma parcial, distorcida, como a sua própria sombra – se lhe lançamos um olhar direto nada vemos, vemos um simples vazio. O Objeto só é acessível através de um adiamento incessante. O Objeto é, portanto, qualquer coisa de criado por uma rede de desvios, aproximações e quase colisões.


7. A Coisa Real é um espectro fantasmático cuja presença garante a consistência de nosso edifício simbólico, permitindo-nos evitar sua inconsistência constitutiva.


8. Todas as nossas posições são relativas, condicionadas por constelações históricas contingentes, de forma que ninguém tem soluções definitivas, apenas soluções pragmáticas temporárias.


9. Nos vinte anos em que tenho dado aula de literatura assisti ao trânsito da crítica por impressionismo, historiografia positivista, new criticism americano, estilística, marxismo, fenomenologia, estruturalismo, pós-estruturalismo e agora teorias da recepção. A lista é impressionante e atesta o esforço de atualização e desprovincianização em nossa universidade. Mas é fácil observar que só raramente a passagem de uma escola a outra corresponde, como seria de esperar, ao esgotamento de um projeto; no geral ela se deve ao prestígio americano ou europeu da doutrina seguinte. Resulta a impressão – decepcionante – da mudança sem necessidade interna, e por isso mesmo sem proveito. O gosto pela novidade terminológica e doutrinária prevalece sobre o trabalho de conhecimento.


10. Por mais que cognitivistas e desconstrutivistas – esses inimigos mortais – clamem em acordo que o Eu “substancial” que precede ao campo aberto da interação social contingente, este Eu “substancial” não existe, por mais que o esoterismo new age ocidental faça coro com a narrativa de que o Eu é apenas um conjunto de eventos mentais heterogêneos e elusivos, por mais que eles clamem, nossa experiência cada vez mais é a de um Eu isolado e imerso em sua esfera neurótica ou alucinatória. Eis-nos ligados à rede por nossos computadores que rodam Windows; no entanto, nós somos cada vez mais organismos isolados sem qualquer janela para a realidade, interagindo sozinhos com uma tela de computador, encontrando apenas simulacros virtuais e presos cada vez mais nas tramas da rede ideológica da globalização.


11. A interpretação da arte a partir unicamente da forma, isolada no belo formal, é pobre perante o fenômeno estético, é uma redução.


12. A importância do dado biográfico para a interpretação da obra é relativa. Embora psicanalistas e críticos literários operem interpretações a partir de textos (um, com as narrativas do inconsciente oferecidas pelos pacientes; o outro, com textos literários), como bem frisa Adorno, o elemento biográfico projetivo no processo de produção dos artistas é, na relação com a obra, apenas um momento e dificilmente o decisivo. O mesmo autor chama atenção para o perigo da aplicação da psicanálise à interpretação de obras de arte, uma vez que sua ênfase nas projeções biográficas acaba por reduzir o fenômeno estético à identidade integral entre obra e artista. Para Adorno, a psicanálise corre sempre o risco de transpor o pedantismo médico para um objeto inadequado e sutil – como Leonardo e Baudelaire ou, entre nós, Machado de Assis ou Clarice.


13. A literatura é uma prática especificamente subjetiva? Em que medida ela ajuda a construir a subjetividade de quem lê?


14. A literatura pode ajudar a entender e construir o real? A interpretação e a crítica de textos literários e de fenômenos culturais pode ajudar a entender e construir o real?


15. A literatura é um ato socialmente simbólico. Por isso a prioridade da interpretação política dos textos literários. A perspectiva política não é um método suplementar ou auxiliar opcional de outros métodos interpretativos hoje em uso – o psicanalítico, o mítico-crítico, o estilístico, o ético, o estrutural –, mas como horizonte absoluto de toda leitura e de toda interpretação.


16. Em plena vigência das sociedades midiáticas e em plena vitória do capitalismo multinacional com discurso e dominação globalizantes, ainda é possível falar em cultura popular? Confrontar as suas reflexões com as de Roberto Schwarz: Como seria a cultura popular se fosse possível preservá-la do comércio e, sobretudo, da comunicação de massa? O que seria uma economia nacional sem mistura? De 64 para cá a internacionalização do capital, a mercantilização das relações sociais e a presença da mídia avançaram tanto que estas questões perderam a verossimilhança.

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